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Acima de todos, o pai

Rubem-PenzPoderia facilmente buscar na minha própria vida, e na vida de muitos queridos amigos, fatos para servirem como exemplo de quanto 2014 foi especial. Também razões para confiarmos em 2015. Poderia, igualmente, buscar nas retrospectivas da TV e dos jornais acontecimentos para considerar o ano que se vai como desastroso, jogando uma sobra sobre o horizonte que se aproxima. Resolvi, para escapar de parecer bobo alegre ou paranoico, recordar uma breve cena que foi ao ar na final do reality show MasterChef Brasil, da Rede Bandeirantes, vencido por Elisa Fernandes. A cena do pai.

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Para quem não viu, vou esclarecer: faltando instantes para esgotar o prazo que as duas competidoras dispunham para montar os pratos a serem julgados, uma delas, Elisa, esbarrou numa tampa de doce emperrada além de suas forças. Tentou tudo, até (perigosamente) destravar a tampa com um cutelo. Em vão. Num ato de desespero, correu na direção da plateia buscando pelo pai. Este, usando a força de homem, conseguiu ajudá-la. Na volta para a bancada, a moça concluiu a sobremesa com a qual pôde vencer a prova.

Fixo-me em um ponto: meses de competição superando adversários poderiam desabar diante do insignificante ato de abrir um vidro de doce. Portanto, Elisa, depois de uma jornada repleta de êxito, dependeu daquela forcinha do pai. Este, virou o herói da noite sem fazer quase nada (ou aquele quase nada que as feministas adoram dizer que sobrou para nós, homens). Foi o momento em que quase nada significou tudo, pois tudo seria perdido por quase nada.

Muito bem: era um pai e isso deles sempre se espera. Mas Elisa não é minha filha e, se lá estivesse, igualmente abriria o vidro (em tese, claro). Desconfio que o marido da Helena, a chef que ficou em segundo lugar, ele mesmo um antigo postulante e também presente na plateia, diante do mesmo dilema, abriria aquele maldito vidro de doce em fair play. O fato é que jamais saberemos quando palavras ou gestos corriqueiros (quase nada) significarão tudo na nossa vida e na vida do outro.

Detalhes assim sutis são capazes de conter importantes lições. Naquela noite, diante da TV, percebi que a verdadeira grandeza não está no ato em si (ou na palavra). Está na disposição de agir ou falar, no zelo, no interesse verdadeiro e altruísta de jamais se omitir. Quando ajudar é algo ao nosso alcance, e muitas vezes pouco nos custa, nem sempre nos movemos na direção do outro. Pois este é meu desejo para o Ano Novo: quando alguma coisa estiver ao alcance para ajudar alguém que precisa, por menor que seja a ação, façamos. Melhor ainda se for na hora exata. Sejamos, enfim, veículos da bondade do Pai.

Rubem Penz é escritor, músico, publicitário, baterista e compositor. Autor de “Enquanto Tempo” e coordenador da oficina literária Santa Sede crônicas de botequim. Seu site é rubempenz.net

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