Ainda que do conto se extraiam imediatamente noções da importância da previsão e da provisão, da poupança e do uso racional dos recursos, também dele podem-se colher importantes lições sobre a prevalência da vaidade sobre a razão, raiz maior do envenenamento espiritual e social que, pensemos bem, vem nos afundando cada dia mais numa crise de valores sem precedentes e que, não nos enganemos, ainda vai nos cobrar uma conta muito alta por nossa irresponsabilidade existencial. O jurista baiano Calmon de Passos usava uma expressão muito interessante para definir tipos cada dia mais comuns em nosso cotidiano: “um zero adornado”.
O vazio existencial que nos atinge precisa ser preenchido de qualquer forma e os recursos aparentemente mais capazes de fazê-lo são aqueles que vemos diante de nossos olhos, já possuídos ou possíveis de sê-lo: bens materiais e reconhecimento social. Os primeiros, num mundo cada dia mais abarrotado de gente a pretendê-los, existem em número menor que nossa pretensão, o que torna sua disputa desequilibrada, pautada pelo jogo sujo, pela truculência como forma e a desonestidade como bússola. Já o reconhecimento social, que em um ambiente equilibrado é consequência do progresso pessoal ou profissional de alguém, é buscado de forma artificial e paranoica, chegando-se ao cúmulo de pessoas mandando mensagens a outras pedindo para curtirem postagens em redes sociais ou outras publicações de seus feitos heroicos ou opiniões extraordinárias.
Os tais “15 minutos de fama” – que o artista Andy Warhol dizia ser direito de todo ser humano – são perseguidos a qualquer custo e o que mais se vê é gente querendo vender imagem do que não é, repetindo frases de literatura barata, fazendo pose de intelectual ou de grande liderança. O olhar para dentro de si, a serena reflexão sobre nossas limitações e a capacidade de compreender que somos parte minúscula de um grande sistema são características que nos fazem crescer na única medida que importa: a de caráter.