O apartamento de Chuck Hipolitho, na zona oeste de São Paulo, tem instrumentos espalhados por todos os lados. Alguns nem pertencem a ele, mas sim a amigos que, de tanto visitar, acabam deixando uma guitarra ou violão por lá.
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Foi neste ambiente que o músico abraçou a ideia de produzir sete gravações amadoras (conhecidas como «demos») em seu próprio smartphone, um iPhone 5S. As músicas foram compartilhadas na internet no ano passado e compiladas no álbum Saigon Shit, lançado na primeira semana deste ano.
A captação da voz e dos instrumentos surpreende pela sua simplicidade: ao invés de usar adaptadores para conectar equipamentos direto ao celular, o registro foi feito com o microfone integrado de um fone de ouvido convencional. Dessa forma, praticamente tudo foi gravado em sua casa, andando pelos cômodos, sentado na mesa de jantar ou até mesmo no chão da sala, onde uma bateria eletrônica, um amplificador de guitarra e vários pedais ficam montados e prontos para serem usados.
«Eu sempre gostei de gravar demos pra registrar ideias e arranjos. Conforme eu empilhava uma trilha em cima da outra, eu comecei a gostar muito do som do microfone no celular», explica. Mais importante que a qualidade da gravação, porém, foi a sensação de liberdade ao produzir músicas em sua própria casa que levou o trabalho adiante. «Ficava bom porque eu estava fazendo relaxado, não estava em estúdio, com pressão. Eu fui gravando as músicas enquanto o dia rolava, fazendo um café ou assistindo televisão.»
André Porto/Metro André Porto/Metro André Porto/Metro
O clima leve também está presente nas letras – todas compostas em parceria com amigos do artista. «Quando comecei a escrever eu pensava muito sobre o que é a liberdade. Cada música tem uma musa em comum, esse algo que você vai atrás pra levar a ideia até o fim. Eu acho que elas falam sobre mim e um pouco sobre os autores que escreveram comigo», contou.
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Por fim, a capa e o nome do álbum são «referências e reverências» (nas palavras do músico) ao filme Apocalypse Now (1979). No início da trama, o protagonista está em um hotel em Saigon, no Vietnã, e se vê alucinando sobre missões de guerra que passou no país. As hélices de um helicóptero se transformam nas pás do ventilador e, ao olhar pela janela, o ator Martin Sheen proclama a famosa frase: «Saigon… shit.»
Montado em casa
Além da produção musical, Chuck Hipolitho assumiu a direção de arte do projeto, chegando inclusive a ilustrar a capa de Saigon Shit e de vários dos singles que foram disponibilizados em plataformas de streaming entre fevereiro e dezembro de 2018. «Eu pegava uma imagem ou fotografava algo, jogava no programa de edição do celular e desenhava em cima. Depois criava um fundo, mandava pro Instagram e ainda aplicava um filtro antes de salvar a versão final», disse.
Com as canções na internet, ele começou a ser cobrado por fãs para lançar um formato físico do trabalho. «As pessoas dizem que querem comprar seu CD, mas ninguém quer ouvir um CD. Elas pedem porque querem ter alguma coisa física sua. Então eu decidi que não procuraria uma gravadora, nem alguém pra prensar, e que faria tudo em casa.»
Em uma caixa amarela, Chuck guarda todas as cópias já produzidas. Elas vêm com um encarte, em arte inspirada nos populares zines da década de 1990 (publicações independentes xerocadas). Cada música, assim como a capa da compilação, é representada por um adesivo. O CD também possui uma numeração, feita a mão pelo artista, para tornar o produto único.
Saigon Shit é vendido a R$ 30 em sua loja virtual, com frete incluso. Nos shows, o álbum sai por R$ 20. Confira a montagem da cópia de número 50:
Chuck & Os Crush
A primeira experiência de Chuck Hipolitho divulgando demos gravadas pelo celular foi em 2016, com o EP Namastê Yeah. Na época, o músico ainda fazia parte da banda Vespas Mandarinas, que se preparava para lançar seu segundo álbum, Daqui Pro Futuro (2017). Ele anunciou sua saída em junho de 2018. «Eu estava cansado da pressão de ser uma banda que precisava ter um resultado comercial. Eu precisava ficar sozinho, fiquei sozinho de banda, de relacionamento, e porque não começar a fazer as coisas sozinho?», questiona ele.
A solidão durou pouco. Assim que o projeto foi evoluindo, veio a vontade de apresentá-lo ao vivo ao público. Com isso, nasceu o Chuck & os Crush, que conta com André Dea (bateria) e Raphael Bertazi (baixo). «Quero ter um pouco menos de controle, começar a colocar pessoas pra adicionar algo delas.» O objetivo é que futuros lançamentos já sejam produzidos e lançados em grupo.
No dia 9 de fevereiro, o trio se apresenta na Casa de Cultura do Butantã (av. Junta Mizumoto, 13 – Jd. Peri), a partir das 18h. A entrada é gratuita.
Superfície de Contato
Assista à performance exclusiva da música Superfície de Contato, gravada no apartamento de Chuck Hipolitho, ao Metro Jornal: