Ano que vem completam-se 100 anos da Semana de Arte Moderna de 1922. Para celebrar este centenário, o Centro Cultural Fiesp e o Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP estreia a exposição “Era Uma Vez o Moderno”, nesta sexta-feira (10). São quase 400 itens entre pinturas, desenhos, diários, fotos e cartas, reunidos pela primeira vez em tamanha dimensão - e já é considerada a maior exposição sobre o modernismo brasileiro realizada até hoje.
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Ao Metro World News, o professor do IEB/USP Luiz Armando Bagolin, um dos curadores da exposição, explica que a mostra herda muito do olhar de um dos próprios fundadores do movimento, o poeta Mário de Andrade. “Montamos uma exposição com um recorte histórico a partir do acervo do IEB. Este acervo tem muito do olhar do Mário de Andrade, porque foi a coleção do próprio, que a USP comprou em 1960″, diz.
“O Mário tinha um olho excepcional: ele estava ligado ao que estava acontecendo no contexto social, político do país, ele era muito antenado. Mesmo à distância, ele sabia o que estava acontecendo com os artistas brasileiros na Europa”, ilustra Bagolin.
O público pode esperar obras e reflexões de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Manuel Bandeira, Cícero Dias, Di Cavalcanti, Osvaldo Goeldi, Ismael Néry, Guilherme de Almeida, Gilberto Freire, entre muitos outros. Ao mesmo tempo, as pinturas expostas ganham camadas de histórias, contadas pelos próprios artistas, por meio de cartas e outros documentos.
Quando Anita Malfatti escreve para Tarsila do Amaral, relatando seus primeiros encontros com a arte moderna, escandalizada, a mostra vai além da mera descrição de tudo isso. “A carta original está na vitrine, ao lado do livro original que ela menciona estar lendo. É um privilégio!”, declara o curador.
Assim, além de toda a camada que o visitante enxerga quando entra no espaço expositivo, há toda uma camada histórica, ao lado das obras, e virtual, que pode ser acessada via QR Code. Tudo isso estará reunido em um livro, de autoria do professor Luiz Armando Bagolin, que será lançado em fevereiro do ano que vem, na mesma semana do centenário.
A exposição
Em “Era Uma Vez o Moderno”, são recontadas três décadas da história desse movimento cultural, compreendendo os anos de 1910 a 1944. “O ponto de partida é a primeira exposição de um artista moderna no Brasil, Emma Voss. Ela era uma alemã emigrada pro Brasil sobre a qual a gente não tem quase notícia nenhuma, exceto uma crítica jornalística não assinada, no jornal O Estado de São Paulo”, relata o curador.
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A única pintura de Voss, um autorretrato, pertence a Pinacoteca, que cedeu o direito de imagem para a exposição no Fiesp. “Depois disso, a gente traz as duas primeiras exposições individuais de Anitta Malfatti. A segunda é aquela que foi detonada por uma crítica do Monteiro Lobato”, afirma.
A exposição em questão foi realizada em 1917 e havia sido um sucesso de público, mas após a crítica publicada no Estadão, a artista foi desacreditada perante o público e até mesmo a própria família. Para complementar esse momento, a exposição apresenta o diário de Anita junto a obras como “O Homem Amarelo”.
Além disso, a mostra traz diversos vídeos com atores encenando momentos importantes das vidas dos modernistas, bem como a história do movimento cultural. Em um deles, por exemplo, o personagem virtual de Mário de Andrade lê um trecho do livro “Pauliceia Desvairada”, tremendo de timidez, durante a segunda noite da Semana de Arte Moderna de 1922.
A exposição passa pelo ápice do movimento e segue em direção a Segunda Geração, em que se destacam nomes como Manoel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade. É o momento em que a exposição mostra outro lado do movimento.
“Foi quando os artistas começaram a fazer uma pintura de gênero, natureza morta, paisagens, retratos. ‘Não me interessa por política, eu vou ser artista’. Tem também aqueles que foram fazer da arte um instrumento político engajado. Na exposição, a gente mostra essas duas posições juntas, simultâneas”, esclarece Bagolin.
O fim se dá com Mário de Andrade, o quase curador póstumo de “Era Uma Vez o Moderno”, desiludido. “Ele estava se sentindo sozinho, porque muitos companheiros de geração, incluindo Manoel Bandeira, foram cooptados pelo Estado Novo. Carlos Drummond de Andrade, por exemplo, virou secretário do governo na era Getúlio Vargas. O Mário foi o único que que resistiu e não cedeu a nenhum tipo de de aliciamento”, relata o curador.
A reflexão, por fim, partirá de cada um. “Não se trata de fazer o aplauso gratuito, nem de fazer crítica sem conhecimento histórico. É tentar ver o que foi aquele contexto e como os modernistas reagiram nesse contexto”, finaliza.
A exposição “Era Uma Vez o Moderno” está em cartaz até 29 de maio de 2022. O Centro Cultural Fiesp está localizado na Avenida Paulista, 1313 - Jardim Paulista. Funciona de quarta a domingo, das 11h às 20h. A entrada é gratuita.
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