As redes sociais revelaram uma prática controversa – e traiçoeira – entre casais. A nova abordagem é chamada de ‘cloutlighting’: uma mistura da influência (‘clout’) das redes sociais e abuso psicológico (‘gaslighting’).
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Se você nunca ouviu o termo, pode já ter assistido aos vídeos, que vêm sendo divulgados há algum tempo.
Neles, alguém faz algo intencionalmente para aborrecer a outra pessoa – em geral, um parceiro.
- Os pais que submetiam filhos a pegadinhas no YouTube – e perderam a guarda de 2 deles
- Por que a personalidade das pessoas muda (muitas vezes para pior) nas redes sociais?
Costuma ser uma pegadinha ou uma tentativa deliberada de entrar em alguma polêmica. Quando a inevitável discussão acontece, o ‘cloutlighter’ começa a filmar com o celular.
E, como se não bastasse, publica nas redes sociais para que pessoas ao redor do mundo julguem a reação.
‘Estou chorando porque você me irrita’
O episódio mais recente, um vídeo filmado no início deste ano, mas que acabou de começar a circular novamente, mostra uma mulher chorando depois que o namorado come sua última garfada de comida, apesar de ela ter pedido para ele não fazer isso.
Não vamos publicar o vídeo para não aumentar ainda mais o sofrimento dela.
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«Não estou chorando por causa da costela», diz ela aos prantos. «Estou chorando porque você me irrita.»
Ela fica tão chateada que chama a mãe para dar apoio. Em resposta, ele afirma que ela é mimada.
E, depois de filmar o choro, publica o conteúdo nas redes sociais.
Mas este não é o primeiro vídeo a mostrar algo assim…
‘Seu gato acabou de morrer’
Há alguns anos, o casal Jesse e Jeana fazia sucesso no YouTube com vídeos de pegadinhas.
O lance dos dois era fazer brincadeiras muito cruéis um com o outro – como quando Jesse convenceu Jeana que sua gata havia morrido, a filmou chorando, riu na cara dela e postou no YouTube.
Embora os vídeos do casal possam ter sido consensuais, as pessoas estão fazendo cada vez mais ‘pegadinhas’ semelhantes sem o aval dos parceiros.
Pegadinha ou abuso?
E a prática tampouco se limita a relacionamentos amorosos.
No ano passado, um pai e a madrasta perderam a guarda de dois de seus cinco filhos depois que publicaram vídeos no YouTube fazendo «pegadinhas» com as crianças.
Em um deles, o filho mais novo era informado que seria adotado por outra família.
O pai negou as acusações de que as pegadinhas eram abusivas.
Há diversão inocente?
O termo ‘cloutlighting’ foi cunhado pela primeira vez por Jessica Lindsay – que escreve para o jornal gratuito britânico Metro – após assistir ao vídeo do rapaz comendo a refeição da namorada.
«Me deixou extremamente desconfortável», diz Jessica. «E embora a maioria dos comentários estivesse fazendo piada às custas da mulher, outros mostraram que eu não estava sozinha ao perceber um sinal de alerta no vídeo».
Os últimos comentários a que ela se refere – que inundaram um tuíte recente sobre o vídeo – foram em defesa da vítima, dizendo que ela devia ter tido um dia difícil e estava louca para comer.
Alguns sugeriram que ela deveria «terminar com ele».
«Me lembrei de todos os tipos de vídeo mostrando comportamentos tóxicos que se tornaram virais, na maioria das vezes sem ninguém chamar a atenção que havia algo errado», acrescentou.
Depois de refletir sobre tudo isso, ela criou o termo ‘cloutlighting’.
O que está por trás
«‘Cloutlighting’ é uma mistura de ‘clout’ (influência) e ‘gaslighting’ (abuso psicológico) – significa, essencialmente, tentar obter engajamento nas redes sociais usando como isca pessoas que estão claramente relutantes e desconfortáveis com as ‘pegadinhas’ ou ‘piadas’.»
Paola Diana, ativista feminista e autora de livros sobre abuso psicológico (tentativa de fazer com que o parceiro duvide de si mesmo ou até mesmo de sua sanidade mental) acrescenta que, em alguns casos, o ‘cloutlighting’ pode ser visto como uma forma de abuso emocional.
«Seja para um milhão de assinantes no YouTube ou algumas centenas de amigos no Facebook, esses vídeos têm um único objetivo: incitar o riso às custas da vítima, que em alguns casos pode estar sofrendo de verdade», diz ela.
Diana cita um vídeo em que um homem finge jogar o filho (na verdade, um boneco) pela varanda, e outro em que a pessoa «confessa» ter traído o parceiro em frente a uma câmera escondida.
«As reações a essas pegadinhas sempre serão extremas, então por que alguém iria querer isso compartilhado com sua família e amigos, sem falar com o mundo inteiro? É uma maneira de fazer a vítima da brincadeira parecer instável.»
«Brincadeiras como essa – embora não ache que ‘brincadeira’ seja a palavra certa – semeiam dúvida na cabeça da vítima; elas deixam você pensando: ‘Será que eu exagerei demais?’ A vítima fica achando que deveria rir de algo que não acha engraçado», acrescenta o psicoterapeuta Toby Ingham.
Se você está pensando em fazer piada do seu parceiro fazendo provocações, filmando seu choro e postando o conteúdo nas redes sociais em busca de compartilhamentos, você deve esperar levar um fora e ser dispensado na hora.
Porque quando você está chateado, por qualquer motivo, a última coisa que você quer é uma câmera na sua cara.
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