Brasil

Justiça Federal vira via comum para destravar seguro-desemprego

A Justiça Federal em vários Estados tem recebido, em 2016, um grande número de processos de pessoas com problemas para receber o seguro-desemprego.

O Metro Jornal analisou em cinco Estados (SP, RS, PR, SC e BA) o número de ações com o assunto “seguro-desemprego”, a maioria contra o Ministério do Trabalho e Previdência Social, que controla o benefício.

Em todos, houve aumento na comparação entre o 1º semestre de 2015 e o 1º semestre de 2016. No Rio Grande do Sul, o número subiu mais de oito vezes no período. No Paraná, mais de dez.

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Na maioria, são pessoas que tiveram o requerimento barrado por questões de documentação. Alcides é administrador de empresas e está com o pedido ‘travado’ por conta de um CNPJ em seu nome, apesar de a empresa ter fechado em 2009.

Esse trâmite, que pode levar semanas, é um dos mais comuns nas ações na Justiça. Trabalhadores como Alcides reclamam que a exigência de fechar o CNPJ, entre vários pontos, não costumava atrasar a liberação do benefício até o final do ano passado.

“Eu já tinha pedido o seguro-desemprego uma vez, há muitos anos, e foi tudo muito rápido. Dessa vez, parece que estão procurando pretexto para enrolar a gente”, diz a enfermeira Sabrina, que diz ter perdido o prazo de 120 dias para solicitar o pagamento por falta de orientação e demora para agendar atendimento.

A judicialização do benefício pode estar ligada a dois indicadores. Entre o começo de 2015 e julho de 2016, o número de desocupados no Brasil subiu de 6,45 milhões para 11,58 milhões, de acordo com o IBGE. O desemprego no país passou de 6,5% para 11,3% no último ano e meio.

Por outro lado, os repasses do governo para o seguro-desemprego caíram. Segundo dados do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira), cedidos pela ONG Contas Abertas ao Metro Jornal, foram pagos R$ 23,2 bilhões de janeiro a julho de 2015 (R$ 25,9 bilhões com a correção do salário mínimo), contra R$ 21,3 bilhões neste ano, uma queda de 17,62%.

“Isso é muito recente. Há até pouco tempo não observávamos problema com o seguro-desemprego. Realmente parece estar havendo uma dificultação nas liberações para segurar esse dinheiro nos cofres da União”, avalia Sérgio Luiz da Rocha Pombo, presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB-PR.

Procurado, o MTPS alega que os pedidos pelo benefício caíram no período, apesar do aumento do desemprego. De janeiro a julho de 2015 foram 4,95 milhões de requerentes, contra 4,63 milhões no mesmo período neste ano. Queda de 6,4%, diz o ministério.

Público reclama de demora e entraves no atendimento 

O simples pedido do seguro-desemprego tem sido um transtorno, de acordo com trabalhadores ouvidos pelo Metro Jornal.

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Para dar entrada na requisição é preciso agendar um horário pela internet para ser atendido em um dos postos municipais (unidades do Sine) que encaminham o pedido ao MTPS. O problema é a falta de vagas.

Gilson e Rodrigo são carpinteiros sem emprego fixo desde o início do ano. Há duas semanas eles conseguiram vaga em um Sine em Curitiba, no Paraná, e dizem ter sofrido para encontrar um horário livre.

“A moça do atendimento disse que a gente tinha que ficar atualizando o site até abrir vaga em algum lugar. Eu nem tenho internet em casa, como é que vou passar o dia inteiro num computador, na lan house, esperando abrir vaga?”, lamentou Rodrigo. A reportagem monitorou o site que controla os agendamentos no Paraná na durante uma tarde, das 13h às 18h, apenas 5 de 40 agências pelo Estado tinham vagas.

“Eu já estava quase agendando para Cascavel [cidade no Paraná a 500km da capital] por falta de vaga”, protesta Ricardo Ribas, que trabalha na construção civil.

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Na Superintendência do Paraná, são frequentes as queixas sobre quedas no sistema. No dia 26 de agosto, a reportagem presenciou uma pane que durou mais de duas horas, paralisou o atendimento e forçou todos a marcarem outra data para voltar.

O MTPS informa que o sistema está passando por atualizações, o que pode “causar intermitência ocasional”. Já os problemas de agendamento são de responsabilidade das prefeituras. 

CNPJ não deve barrar benefício

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O MTPS (Ministério do Trabalho e Previdência Social) tem impedido qualquer pessoa que tem uma empresa em seu nome de obter o seguro-desemprego, mesmo que ela esteja sem atividade e sem receita há muitos anos.

Embora ajude a combater fraudes de quem tem ganhos extras e tenta conseguir o benefício, essa medida não é prevista em lei. Por essa razão, a Justiça Federal no Paraná tem concedido todas as liminares àqueles que entram com essa demanda.

“Se a empresa não teve renda, não existe por que [o benefício] ser indeferido. Isso passou a ocorrer depois que interligaram o sistema do ministério com o da Receita Federal”, explica um advogado que trabalha nesses casos.

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Apesar do valor limitado – são até cinco parcelas de no máximo R$ 1,542 mil –, muitos entram na Justiça.

“A pessoa já não tem mais saída pela via administrativa, não tem renda e está desamparada. Nem chega a ser um transtorno, muitos têm procurado [a via judicial]”. Na avaliação deste advogado, o número de ações deve aumentar. “Está cada vez mais precário conseguir o benefício. O ministério caminha para virar um novo INSS, alvo de muitos processos”, prevê.

O MTPS esclarece que o CNPJ, de fato, bloqueia o pagamento, mas aqueles que comprovam ter o cadastro inativo, sem renda, têm o benefício liberado. 

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