Está em tramitação na Câmara dos Deputados da Itália um projeto de lei que amplia consideravelmente o tamanho do público apto ao reconhecimento de cidadania italiana por direito de sangue (ius sanguinis), além de flexibilizar o processo de certificação.
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O texto é de autoria dos deputados Alessandro Pagano, Giulio Centemero, Dimitri Coin e Luis Roberto Lorenzato – este último ítalo-brasileiro e eleito pela circunscrição da América do Sul. Todos eles pertencem ao partido ultranacionalista Liga, que batalhou para impedir a introdução do princípio do direito de solo (ius soli) na legislação.
O projeto ainda terá de passar pelas comissões de Justiça e Relações Exteriores da Câmara, mas deve ser levado a plenário nos próximos meses, com mudanças há muito cobradas pela comunidade ítalo-descendente.
Novidades
A principal novidade é a extensão da transmissão de cidadania às mulheres que se casaram com estrangeiros antes da entrada em vigor da Constituição, em 1948. Atualmente, descendentes dessas mulheres não são reconhecidos como cidadãos italianos.
«É cidadã a mulher que foi cidadã por nascimento e perdeu a cidadania enquanto conjugada com um estrangeiro, mesmo se o matrimônio foi contraído antes de 1º de janeiro de 1948», diz o artigo oitavo do texto, enviado com exclusividade à ANSA pelo deputado Lorenzato. Filhos nascidos antes de 1948 de mulheres que perderam a cidadania também serão considerados italianos.
O projeto ainda abre a possibilidade de reconhecer a cidadania no município de origem do antepassado italiano, e sem a necessidade de esperar a conclusão do processo na Itália.
«Você vai na cidade do seu avô, na prefeitura, abre o documento, e eles registram. Aí você decide se quer ficar lá ou voltar para o Brasil. Não vai precisar mentir», acrescentou o deputado, citando os inúmeros casos de pessoas que fingem fixar residência na Itália para acelerar a tramitação de sua cidadania. «Essas pessoas não vão porque querem. É uma forma de passar essa intransponível fila [nos consulados]», ressaltou.
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Continuará sendo possível certificar a cidadania em outros municípios da Itália. Neste caso, além de comprovar residência, o candidato terá de apresentar um contrato de trabalho válido; ou desenvolver uma atividade autônoma; ou se inscrever em um curso escolar de nível médio, superior ou universitário; ou participar de «cursos formativos ou culturais de duração mínima de um ano».
A taxa de 300 euros, criticada pelo deputado, está mantida no projeto de lei, porém as contribuições passam a ser destinadas exclusivamente à contratação de pessoal consular da própria cidade ou, no caso de processos feitos na Itália, o valor arrecadado ficará com as prefeituras.
«Vamos melhorar a lei – e eu sou contra criar taxa – para que você aplique o dinheiro em funcionários locais, porque valoriza o italiano nascido no exterior. E estendemos os 300 euros porque os prefeitos, ganhando alguma coisa, não vão poder se negar. É uma receita a mais para a Prefeitura», disse.
O prazo para conclusão do procedimento será de até três anos para os consulados – hoje são dois – e de até seis meses para as prefeituras.
Pré-unitários
Outro pilar do projeto é a ampliação do direito de cidadania para descendentes de imigrantes provenientes dos Estados pré-unitários, ou seja, aqueles que povoavam a península antes da unificação do Reino da Itália, em 1861.
Dessa forma, alguém cujos antepassados remontam ao Grão-Ducado da Toscana, por exemplo, também teria a chance de se tornar italiano, mas por meio da naturalização.
O projeto propõe ainda que quem tiver cidadania reconhecida e transferir residência para a Itália ganhará benefícios fiscais para comprar a primeira casa e a admissão automática de diplomas obtidos no exterior, além da inscrição na ordem de sua categoria profissional.
Resistências
O projeto dos deputados da Liga vai na contramão de iniciativas que foram ventiladas na legislatura passada, que propunham até a imposição de um limite de geração para a cidadania.
A última proposta do tipo discutida no Parlamento, já engavetada, previa que apenas descendentes de até segunda geração fossem reconhecidos como cidadãos italianos. Ainda assim, Lorenzato acredita que terá o apoio necessário.
«Quem queria a restrição eram os candidatos derrotados nas eleições e a esquerda italiana», acusou. Na prática, bastam a Liga e o M5S para a iniciativa ser aprovada, mas o ítalo-brasileiro espera obter votos além das bancadas do governo. «Ninguém tem coragem de ir contra os próprios filhos», declarou.