A cerimonialista Raquel Aderaldo Girao, de 38 anos, viveu um pesadelo com o filho Bernardo, de 2 anos. O menino foi diagnosticado com SIM-P (Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica) no ano passado, após quadro de covid-19.
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Raquel conta que a família toda foi contaminada pelo vírus em abril – ela, o marido e os quatro filhos. Bernardo, na época com 1 ano, apresentou apenas diarreia. De tão leve, o exame para detectar a doença, inclusive, chegou a dar negativo.
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Dois meses depois, o bebê começou a apresentar febre persistente. O médico solicitou exames, mas nada foi identificado. A febre não cessou e o menino precisou ser internado. Não demorou para outros sintomas aparecerem: vômitos, dor de cabeça, conjuntivite e manchas na pele. Por fim, uma meningite. E aí o diagnóstico de uma síndrome até então pouquíssimo conhecida: a SIM-P.
A alta veio após 14 dias, mas os cuidados permanecem até hoje. Pelo período de dois anos é indicado repetir exames como hemograma e ecocardiograma para acompanhar o quadro.
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«Mesmo tendo tido uma covid leve, que nem o exame foi capaz de mostrar, meu filho desenvolveu a síndrome. Acho importante alertar outros pais que a falta de sintomas não exclui o risco», diz Raquel.
A mãe lembra dos momentos de angústia. «Foi dificílimo. Não se sabia muita coisa sobre essa síndrome, não havia um tratamento específico e poucos médicos sabiam lidar com ela. Passei os dias rezando e pedindo a Deus pela recuperação do Bernardo.»
«Meu alerta é para que os pais busquem um médico de referência logo no início dos sintomas. Com a covid não se brinca. Já estava muito tranquila, achando que estávamos todos livres e imunes, e foi então que passamos por esse grande susto», completa Raquel. «No quarto ao lado, uma criança com a mesma síndrome faleceu por complicações cardíacas. Hoje sou muito grata pela saúde do meu filho.»
Mas afinal, o que é SIM-P?
A SIM-P é uma síndrome pós-infecciosa. Geralmente ocorre dias ou até semanas após a infecção pela covid-19. Crianças que foram contaminadas pelo novo coronavírus podem ou não desenvolvê-la.
«Trata-se de uma consequência da resposta inflamatória desencadeada pelo vírus. É chamada de multissistêmica porque pode acometer diversos órgãos», explica a Khristiani de Almeida Batista Vilamiu, intensivista em pediatria e professora de Medicina da Uninove.
É importante frisar que, felizmente, a síndrome é muito rara – um alento para os pais que têm se assustado com casos sendo compartilhados em grupos nas redes sociais.
A exemplo do que houve com Bernardo, crianças com sintomas leves de covid-19 ou mesmo assintomáticas podem desenvolver a síndrome. Indivíduos de 0 a 17 anos são alvos da doença, mas o mais comum é que ela atinja a faixa etária a partir dos 8 anos.
A especialista cita alguns critérios que levam a equipe médica a suspeitar do diagnóstico, similar a tantas outras mazelas. «Deve haver febre persistente que dura três dias ou mais associada a pelo menos mais dois sinais de acometimento de outros órgãos, como conjuntivite, feridas na boca, lesões nas mãos ou inflamação no músculo do coração. Pode ainda haver dor na barriga, vômito, diarreia além, é claro, do histórico de covid-19.»
Como a síndrome pode evoluir para a falência de alguns órgão, quanto mais cedo ela foi identificada e tratada, melhor. «Se a criança está com febre, dor abdominal, vomitando, não consegue ingerir líquido e apresenta cansaço, os sinais indicam que a família deve procurar o pediatra ou um serviço de urgência», aconselha Khristiani.
Casos em São Paulo
A Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo informou que, até o dia 20 de março, foram registrados 147 casos e 11 óbitos de SIM-P. Desse total, 35 casos foram registrados apenas neste ano.
Já a Prefeitura, também por meio de sua Secretaria da Saúde disse que desde o início da pandemia até semana passada já foram registrados 49 casos confirmados da síndrome, dentre eles quatro mortes.
Crianças e covid
Se o aparecimento da SIM-P está ligada à contaminação pela covid-19, é fundamental que os pais protejam ao máximo seus filhos da exposição ao vírus, mesmo sabendo que a manifestação em crianças é, em geral, muito leve.
Nos pequenos, os sintomas mais frequentes são tosse, coriza, febre baixa e mal estar. Raramente há perda de paladar e olfato. Quadros inespecíficos podem aparecer, como diarreia, vômito e problemas urinários.
«O uso da máscara é recomendado acima dos dois anos de idade. A forma de proteção é a mesma para adultos e crianças: ficar longe de pessoas e evitar aglomeração. Quem sai de casa – os pais ou outros cuidadores – devem tomar cuidado para não haver o contágio domiciliar. Por isso, use máscara, pratique o distanciamento social e lave aos mãos ao retornar», orienta Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria).
Ainda segundo Kfouri, crianças com quadro de síndrome gripal não devem deixar de ser testadas. «Não significa que o diagnóstico vá induzir a algum tratamento. No entanto, essa criança terá de ser isolada e o resultado servirá para fazer o rastreamento de contatos.»