A Fundação Saúde do Estado do Rio de Janeiro continuou a fazer pagamentos ao laboratório PSC Lab Saleme mesmo após ter ciência de laudos errados, que fizeram com que seis pessoas fossem transplantadas com órgão infectados com HIV. Em setembro, quando o caso já tinha sido revelado, foi feito o repasse de R$ 857 mil à empresa, conforme reportagem do G1. Questionada, a entidade disse que os valores são referentes “às despesas realizadas em meses anteriores” (veja a nota completa abaixo).
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A Secretaria Estadual de Saúde informou que soube dos erros nos laudos emitidos pelo laboratório no último dia 10 de setembro, depois que uma pessoa, que foi transplantada em janeiro deste ano, procurou atendimento médico. Ela passou por exames, que atestaram a infecção por HIV. Como antes do procedimento o mesmo exame teve resultado negativo, levantou a suspeita sobre o transplante.
Conforme a reportagem, outros três pagamentos, que somavam R$ 299.003,95, foram datados entre 1º e 9 de outubro. Contudo, nesses casos, a Fundação Saúde informou que os repasses não chegaram a ser feitos.
“A Fundação Saúde informa que não foi realizado pagamento após 01/10. Todos os pagamentos ao laboratório PCS estão suspensos e uma sindicância foi aberta no dia 07/10. Os valores pagos em setembro são referentes às despesas realizadas em meses anteriores, que já tinham sido faturados quando foi determinada a instauração da sindicância”, destacou a entidade.
“Os comprovantes apresentados pela reportagem se referem a serviços prestados antes da interdição do Laboratório. Conforme está na própria nota de liquidação, a competência é a junho de 2024. Esse serviço foi pago em setembro. O documento SEI 85239326 e a Nota Fiscal 51385 são referentes a serviços prestados em julho, que não foram pagos pela Fundação em função da suspensão do contrato. No total, a Fundação pagou, em setembro, cerca de R$ 857 mil ao Laboratório PCS”, concluiu a fundação.
Desde a descoberta do caso, a Secretaria Estadual de Saúde informou que o PCS Saleme não presta mais nenhum tipo de serviço ao estado. Agora os testes dos doadores passam a ser feitos exclusivamente pelo Instituto Estadual de Hematologia.
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Entenda o caso
O erro que resultou na infecção dos pacientes ocorreu dentro de uma das unidades do laboratório Patologia Clínica Doutor Saleme (PCS-Saleme), contratado pela Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro. O estabelecimento emitiu laudos negativos de HIV para dois doadores de órgãos que tinham o vírus. Ao todo, nove órgãos foram doados, sendo que seis pessoas foram contaminadas.
O caso só foi descoberto depois que uma pessoa, que foi transplantada em janeiro deste ano, procurou atendimento médico no último dia 10 de setembro. Ela passou por exames, que atestaram a infecção por HIV, confrontando exames anteriores ao procedimento.
Assim, o hospital notificou a Secretaria Estadual de Saúde, que instaurou uma investigação. Havia amostra do sangue de um doador guardada no Hemocentro do Rio, quando novos testes foram feitos e positivaram para HIV. Depois disso, a pasta levantou quem recebeu os órgãos dessa pessoa e descobriu que mais duas delas foram infectadas.
O caso continuou sendo apurado e só no início de outubro foram identificados mais três pacientes contaminados a partir daqueles órgãos, mas isso porque outro homem procurou atendimento médico e descobriu que está com HIV.
Após a repercussão do caso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Vigilância Sanitária do Estado realizaram uma vistoria e fecharam a unidade do laboratório PCS Saleme, localizada dentro de um instituto de saúde na Zona Sul do Rio de Janeiro.
Em nota, o laboratório PCS Saleme disse que os resultados preliminares da sindicância interna apontaram um erro humano na transcrição dos resultados dos dois testes de HIV. Informou também que está à disposição das autoridades e colaborando com o governo do Rio de Janeiro. Além disso, informou que dará todo o suporte necessário às vítimas assim que tiver acesso oficial às identidades delas.
Investigação
A Polícia Civil investiga o caso e já prendeu quatro suspeitos pela emissão dos laudos errados no PCS Lab Saleme. Se tratam de Walter Vieira, responsável técnico do laboratório, além de Ivanilson Fernandes dos Santos, Jacqueline Iris Bacellar de Assis e Cleber de Oliveira dos Santos, funcionários apontados como responsáveis pelas emissões dos laudos errados.
Conforme o delegado Felipe Curi, secretário estadual da Polícia Civil, o estabelecimento reduziu as análises dos órgãos que seriam transplantados intencionalmente para lucrar. “Houve uma falha de controle operacional na qualidade dos testes de HIV, tudo isso para obter lucro”, disse o investigador.
Além de investigar essa questão, que fez com que os pacientes acabassem contaminados com HIV, a polícia também apura como foi feito o processo de contratação da empresa pela Fundação Saúde.
Um dos sócios do laboratório, Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, é primo do ex-secretário de Saúde Doutor Luizinho, deputado federal e líder do PP na Câmara dos Deputados. O político deixou o cargo três meses antes da contratação do laboratório. No entanto, chama atenção o fato de que a irmã dele, Débora Lúcia Teixeira, trabalha na Fundação Saúde.