Uma nova pesquisa desenvolvida pela Universidade de São Paulo (USP) traz uma nova proposta de tratamento de Alzheimer, e pode inserir maridos e esposas de pacientes na recuperação do cônjuge. Canções do repertório autobiográfico do casal, que trazem lembranças de fatos e situações vividas juntos, amenizam sintomas relacionados à demência – como a agitação – e possibilitam mais qualidade de vida ao cuidador.
A música tem sido uma ótima estratégia terapêutica para lidar com a tarefa de cuidar de um familiar nessa condição. Com a evolução da doença neurodegenerativa, pessoas podem ficar totalmente dependentes e também mais agressivas, agitadas, com déficits de memória e declínio motor e cognitivo.
Segundo o autor, musicoterapeuta e mestre em Gerontologia Mauro Amoroso Pereira Anastácio Júnior, a música exerce enorme influência na vida humana. No caso do idoso, as canções estimulam sentimentos, sensações e remete a épocas, pessoas, lugares e experiências vividas, evocando emoções guardadas na memória.
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Com formação musical e trabalhando mais recentemente com pesquisas na área do envelhecimento pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, Anastácio uniu as duas áreas e procurou investigar o efeito da musicoterapia nas relações familiares conjugais e de amizade de cuidadores que eram cônjuges de pacientes diagnosticados com Alzheimer.
Cantando juntos
Ao todo, foram doze atendimentos semanais direcionados a quatro casais idosos que moravam no município de São Paulo. O pesquisador estabeleceu alguns critérios para a escolha das pessoas: que um dos indivíduos tivesse diagnóstico de Alzheimer em estágio inicial ou moderado e que o cuidador tivesse assumido essa função há mais de seis meses.
Por meio de entrevistas, antes e depois das intervenções, Anastácio resgatou as canções mais significativas da história de vida do casal. Uma das atividades levadas à sessão foi a gravação dos dois cantando alguma música do repertório deles e, em seguida, propôs que ouvissem a gravação juntos. Em alguns momentos, Anastácio também recorreu aos instrumentos musicais. O violão favorecia o acompanhamento harmônico das canções.
Nos resultados apurados por Anastácio, embora os cuidadores se sentissem cansados pelas demandas associadas à doença, a musicoterapia trouxe momentos prazerosos ao casal. Isso amenizou os sintomas comportamentais dos companheiros adoecidos e possibilitou o resgate e a troca de lembranças pessoais, como relata uma das participantes da pesquisa. “A musicoterapia trouxe o prazer de se expressar, sem ser julgada. É uma sensação de tranquilidade e de dar chance de relembrar o que se viveu”, diz ao Jornal da USP.
Com relação ao fato de ter tido que assumir a tarefa de cuidar do companheiro, a experiência com a música trouxe maior percepção de seu papel social e familiar e mais qualidade e bem-estar no relacionamento conjugal, como disse uma das depoentes. “Sempre nos demos bem e hoje há um sentimento de gratidão por toda a vida que tivemos juntos”, salienta ao Jornal da USP.
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Demência e Alzheimer
Segundo Mauro Amoroso Pereira Anastácio Júnior, a demência é uma síndrome cerebral progressiva que afeta memória, pensamento, comportamento e emoção. Embora cada processo seja individual, eventualmente os indivíduos com demência tornam-se incapazes de cuidar de si mesmos e necessitam de ajuda para todas as atividades, explica o pesquisador ao Jornal da USP.
Existem mais de 100 formas de demência, sendo a mais conhecida a doença de Alzheimer. Ela causa a destruição das células cerebrais, interrompendo a transmissão de mensagens no cérebro, o que afeta a capacidade de se lembrar, falar, pensar e tomar decisões. Ainda não se sabe ao certo o que causa a morte das células nervosas, porém há certos tipos de lesões que podem ser observadas em áreas danificadas do cérebro. Isso confirma o diagnóstico da doença de Alzheimer.
Envelhecimento populacional brasileiro
O estudo também apresenta dados sobre a tendência de desenvolvimento de doenças neurodegenerativas no Brasil impulsionada pelo envelhecimento da população. Em 1950, a expectativa de vida era de 51 anos; em 2016, passou para 75,8 anos e a previsão para 2040 é de 80 anos, segundo a pesquisa.
“É preciso adotar abordagens terapêuticas para o manejo da doença, uma vez que os medicamentos farmacológicos disponíveis dão conta apenas dos sintomas”, enfatiza o mestre em Gerontologia ao Jornal da USP.
A pesquisa de mestrado Musicoterapia e doença de Alzheimer: um estudo com cônjuges cuidadores foi defendida em maio de 2019, sob a orientação da professora Deusivania Vieira da Silva Falcão, do Programa de Pós-Graduação em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP.